segunda-feira, 14 de julho de 2014

PELOTEANDO NO VARZEDO



Buenas Gauchada!
- Tchê, Eleutério! Hoje nós temos que deixar o galpão nos trinques, porque tá vindo um manojo de parceiros, prá sorver um chimarrão e engatihar uma charla em volta do fogo de chão.
- Entonces vô buscá uns tronco prá arrepia as labareda e adespos vô prepará aquela cachacinha, num estilo bem campero, que que tu acha?
- Tá certo, busca uns troncos de espinilho e encosta perto do fogão a lenha, que na hora da precisão, já tá no feitio. Mas antes de meter a mão na canha, me passa um pouco de creolina no piso e depois dá uma varrida, com a vassoura de guanxuma, no piso do galpão.
- Porque todo esse fudunço, logo hoje, tchê?
- Deixa de sê intrometido, tchê. Tu não sabe que a cuerada vem escutar o jogo e depois, ainda, vamos fazer uma partida de futebol, lá no potreiro dos guaxos?
- Ah, então é por isso que tu fica me dando gambeta que nem quero-quero quando cuida do ninho e anda lidando com cal práqueles lados, desde ontonte?
- Claro, tchê! Eu estava fazendo a marcação da cancha.
- Tá especial. Entonces vou aprepará um amargo daqueles, com o topete mais alto que o cerro do Caverá e prá amadrinhar o mate, hoje vô dispensá prá gauchada aquela cachaça curtida com raiz de salsa, que tal?
- Mas que barbaridade! Quando tem cachaça entreverada na prosa tu fica mais assanhado que lagarto em ninho de angulista choca. É só nisso que tu pensa, tchê?
- Que nada xirú véio. Prá deitá a cachaça no bucho, vô fazê uma cama de graxa com o torresmo de porco, que tá de molho na barrica da banha e prá chupá a gordura da pança da gauchada, vô socá um monte de milho pipoca, que tá oreando lá no paiol.
- Bueno, já que tu vai no paiol buscar o milho, enfia na panela de ferro uma cucharra de banha e traz ela junto, prá nos estourar as pipocas aqui no fogo de chão.
Enquanto a panela preta esquentava, apoiada na grade da trempe e a banha derretia nos atracamos a debulhar o milho, atirando o sabugo nas chamas, que crepitavam, formando centenas de estrelinhas coloradas, que subiam prás bandas da quincha do galpão.
Estávamos os dois, com tenência na lida da debulha e ensimesmados nos pensamentos, quando o Eleutério dá uma pigarreada e, de sopetão, me pergunta: Tu gosta do jogo de bola?
- Claro que gosto. Não só gosto, como também bato uma bolinha, lhe respondi.
- Mas báh, tchê! Eu também já dei uns pataços nas peladas da várzea. Forum pocas vez, mas teve uma das vez que eu nunca mais me esqueci.
De certa feita, um criador de cavalo de Uruguaiana me contratô prá domá uma tropilha. Fiz o serviço e de inhapa amansei uma potranca zainita, que ficou prá montaria da fia do tal fazendero.
Na hora de acertá as conta, o home, vendo que eu tinha jeito prá cosa, me faz uma proposta prá eu ficá de compositor dos pareiero que ele criava. Como eu me apercebi que a prenda, fia do tal, andava me espichando os óio, de vereda aceitei.
Com a minha composição, ensiguidita os pareiros tavum nas ponta dos casco e nas carreras de cancha reta, que o fazendero atava lá na Cancha das Chirca e nas penca da Cancha dos Matias, os cavalo que eu aperparava tavum dando pelegaço de paleta, de meio-corpo e até de luz.
Desta manera, o véio andava enchendo a guaiaca, porque ganhava as aposta de campo aberto que ele fazia e eu também tirava a minha lasca, quando escondidito no más, chamava a chinoquita na chincha.
Acontece que o tal do estanciero também era da diretoria do Ferro Carril, um dos clube de futebol da cidade, que no ano de 1976 disputava o Campeonato Gaúcho, na premera divisão e se aperparava prá jogá, na Capital, contra o Internacional.
O escrete do Ferro Carril veio a Porto Alegre e no dia vinte e três de maio de setenta e seis, levo catorze puaço no lombo, sem dá nenhum. Mas, uma semana antes dessa data, nós, lá na cabanha, montemo um time dos peão, prá ajudá nos treno da equipe.
Nesse dia eu fui escalado prá ficá na reserva e se entrasse no jogo, ia jogá na defesa, ajudando o Pilincho – nosso golero – a protegê o gol. Entonces, como eu tinha ficado no banco – e talvez nem entrasse na partida – aproveitei a olada e na sombra das arve, fui dar uns beiçasso na fia do home.
O time deles entrô em campo completo. O Edgar Fagundes, que era o técnico escalou para a partida o Vilson, o Almerindo, o Alemão e o Dirceu; o Ênio, o Amarante e o Caçapava; o Alvim, o João Pedro e o Jorginho e no gol o Orlando Pataca, que pesava mais de cem quilos.
Lá pelos quinze minutos de jogo, ainda no zero a zero, o Alvim mandô uma pedrada, que o Pilincho defendeu com o pé, fazendo a bola subi e caí bem no meio dos gaio do cinamomo onde, embaxo, o fazendero mateava enquanto olhava a partida.
Caiu semente prá tudo que era lado, inté dentro da oreia do estanciero. Quando ele sentiu aquilo dentro da oreia, se assusto e tentou tirá com o dedo. Invez de tirá, empurrou mais prá dentro. Quando a semente fico lá no fundo, o índio véio sentou na maneia, abriu a goela e armou um baita entrevero.
A muié do fazendero, sem sabê o que fazê, gritava mais que galinha atada pelo rabo; a filha, que cambicheava comigo num capão de mato ali perto, vendo o banzé, saiu correndo e temendo a morte do pai, também acompanhava a mãe no gritedo; os puxa-saco, parecium um monte de mosca tonta, correndo de um lado pro outro e o estanciero continuava gritando mais do que cachaço na hora da castração.
Eu fui me achegando, devagarito, e querendo aumentá a minha média com o pai da prenda, falei grosso: calma que eu dô um jeito. Já salvei muita vaca ingasgada, dano um botaço na goela, não vô se capaz de tirá uma bosta de sementinha de dentro duma oreia?
Enfiei dois dedo nas fuça do vivente, mandei ele fechá a boca e dá uma assoprada, com bastante força, pelo nariz.
Dito e feito. A semente saiu zunindo da oreia do guasca, parecendo inté uma bala saindo do cano dum trinta e oito. A fazendera, aliviada com a situação e encantada com a solução, alcança um copo de canha pro marido e diz:
- Que gaúcho macanudo é esse meu véio? Tão prestativo, calmo e controlado na hora do aperto. Será médico? Veterinário?
- Que nada, é um changuero lá da estância, Mas acho que vai sê nosso genro, diz o fazendero, com cara de quem comeu e não gosto.
- Quié isso véio? De onde tu tirou essa ideia?
- Ué, tchê! tu precisa vê o chero que eu senti nos dedo dele.
Bueno Eleutério, enquanto eu fico engolindo mais essa mentira tua, vamos indo lá pras bandas do potreiro, que a peonada já tá peloteando no varzedo.
Fonte! Coluna Charla de Peão, por Juarez Cesar Fontana Miranda (poeta nativista), publicada no Jornal Regional do Comércio, dos pagos da cidade litorânea de Cidreira (RS), edição do dia 13 de julho de 2014. Contatos com o colunista, mande um chasque abagualado para juarezmiranda@bol.com.br ou jornaljrcl@terra.com.br

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